Prefeito do Rio tenta cortar direito de quem já venceu na Justiça com projeto que reduz teto de pagamento rápido

Prefeito Eduardo Paes propõe reduzir de 30 para 10 salários mínimos o teto das RPVs no Rio, o que empurra milhares para a fila de precatórios. Medida foi enviada à Câmara sem transparência.

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Foto: Beth Santos

O senhor Prefeito Eduardo Paes enviou à Câmara Municipal mais uma das suas já conhecidas maldades contra os servidores públicos, aposentados, pensionistas e cidadãos comuns: um Projeto de Lei que reduz de 30 para apenas 10 salários mínimos o teto para as Requisições de Pequeno Valor (RPVs). A medida atinge diretamente quem já venceu a Prefeitura na Justiça e que, até agora, podia receber rapidamente o valor devido. Se aprovado, esse corte empurrará milhares de pessoas para a lenta fila dos precatórios.

E o mais grave: em nenhum momento o Prefeito menciona na justificativa do Projeto de Lei que está reduzindo esse teto de 30 para 10 salários mínimos. Nem o texto do PL, nem sua justificativa, nem a legislação citada têm coragem de afirmar claramente qual é a verdadeira mudança proposta. Uma omissão deliberada, uma tentativa de esconder da sociedade o impacto real e perverso da medida.

Para piorar, o Prefeito pede na Mensagem que encaminha esse Projeto de Lei que ele tramite em regime de urgência.

Esse é mais um exemplo da forma antidemocrática como Eduardo Paes governa: envia projetos à Câmara omitindo pontos essenciais, tentando aprovar mudanças profundas sem debate público e sem transparência. É um comportamento autoritário e desrespeitoso, não apenas com os vereadores, mas com todos os cidadãos da cidade.

O que é a RPV — e por que é tão importante?

A Requisição de Pequeno Valor (RPV) é um instrumento que permite o pagamento de dívidas judiciais de menor valor sem a necessidade de precatório, ou seja, sem fila e sem a burocracia de inscrição no orçamento do ano seguinte. Ela garante que o credor receba o que lhe é devido em até 60 dias após o trânsito em julgado da sentença, direto na conta.

A diferença entre a RPV e o precatório não é apenas de tempo — é de dignidade.

Com a RPV:

O servidor ou cidadão não precisa esperar anos.

O pagamento é rápido, simples e sem burocracia.

A Justiça se torna efetiva: o direito reconhecido se concretiza.

Com o precatório:

O pagamento pode demorar anos.

Depende de disponibilidade orçamentária.

Mesmo quem venceu na Justiça continua sem ver o dinheiro.

É como ganhar, mas continuar de mãos vazias.

Agora, Paes quer reduzir o teto da RPV de 30 para 10 salários mínimos. Isso significa que qualquer dívida da Prefeitura acima de R$?15.180,00 (considerando o valor atual do salário mínimo) entrará na fila dos precatórios. Ou seja, uma condenação de R$?20 mil, R$?25 mil ou mesmo R$?30 mil — valores que não são altos para o Município, mas são consideráveis para o cidadão — se transformará em anos de espera para quem tem direito a receber.

O que dizem as legislações constitucional, nacional, federal, estadual e municipal — e por que a mudança proposta é injustificável

O limite de 30 salários mínimos como teto para as RPVs está em vigor há décadas no Município do Rio de Janeiro. É um patamar consagrado por leis federais e estaduais, e se aplica automaticamente nos casos em que não há lei específica do ente federativo fixando outro valor.

Segundo a legislação constitucional, nacional, federal, estadual e municipal, enquanto não houver lei municipal específica sobre o assunto, os 30 salários mínimos seguem sendo o limite a ser aplicado no Município. Veja abaixo:

“Constituição Federal, de 1988

(…)

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)

§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave, ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, itido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 94, de 2016)

§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)

§ 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis próprias, valores distintos às entidades de direito público, segundo as diferentes capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)”

(…)

“Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

(…)

Art. 97. (…)

§ 12. Se a lei a que se refere o § 4º do art. 100 não estiver publicada em até 180 (cento e oitenta) dias, contados da data de publicação desta Emenda Constitucional, será considerado, para os fins referidos, em relação a Estados, Distrito Federal e Municípios devedores omissos na regulamentação, o valor de: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)

I – 40 (quarenta) salários mínimos para Estados e para o Distrito Federal;

II – 30 (trinta) salários mínimos para Municípios. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009)”

(…)

“Lei nº 12.153, de 22 de dezembro de 2009

Dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

(…)

Art. 13. Tratando-se de obrigação de pagar quantia certa, após o trânsito em julgado da decisão, o pagamento será efetuado:

I – no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, contado da entrega da requisição do juiz à autoridade citada para a causa, independentemente de precatório, na hipótese do § 3º do art. 100 da Constituição Federal; ou

II – mediante precatório, caso o montante da condenação exceda o valor definido como obrigação de pequeno valor.

§ 1º Desatendida a requisição judicial, o juiz, imediatamente, determinará o sequestro do numerário suficiente ao cumprimento da decisão, dispensada a audiência da Fazenda Pública.

§ 2º As obrigações definidas como de pequeno valor a serem pagas independentemente de precatório terão como limite o que for estabelecido na lei do respectivo ente da Federação.

§ 3º Até que se dê a publicação das leis de que trata o § 2º, os valores serão:

I – 40 (quarenta) salários mínimos, quanto aos Estados e ao Distrito Federal;

II – 30 (trinta) salários mínimos, quanto aos Municípios.”

“Lei nº 5.781, de 01 de julho de 2010

Altera a Lei nº 2.556, de 21.05.1996, que cria os Juizados Especiais Cíveis e Criminais na Justiça do Estado do Rio de Janeiro, dispõe sobre sua organização, composição e competência, criando os Juizados Especiais da Fazenda Pública, a estrutura das Turmas Recursais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública e dá outras providências.”

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

(…)

Art. 26. São obrigações de pequeno valor, a serem pagas independentemente de precatório:

I – as que tenham como limite o valor de 40 (quarenta) salários mínimos, quanto ao Estado;

II – as que tenham como limite o valor estabelecido nas leis municipais.

§ 1º As obrigações de pequeno valor terão como limite mínimo o maior valor de benefício do regime geral da previdência social, nos termos do § 4º do art. 100 da Constituição Federal.

§ 2º Até que se dê a publicação das leis de que trata o inciso II deste artigo, nos termos do § 2º, do art. 13, da Lei nº 12.153/2009, os valores serão de até 30 (trinta) salários mínimos, quanto aos Municípios.

§ 3º Os pagamentos serão feitos pela entidade devedora, mediante requisições de pequeno valor, no prazo máximo de sessenta dias.”

Já no nosso Município, esse tem sido há anos o limite aplicado para a RPV, estabelecido nas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs), como se pode ver, por exemplo, na lei referente ao exercício de 2004, abaixo:

“Lei Municipal nº 3.605, de 26 de dezembro de 2003

Dispõe sobre as Diretrizes Orçamentárias para o Exercício Financeiro de 2004 e dá outras providências.

(…)

Art. 49. Para pagamentos dos débitos consignados em precatórios judiciais de pequeno valor, na forma preconizada pela Emenda Constitucional nº 37, de 12 de junho de 2002, a lei orçamentária anual destinará dotação específica.”

Veja abaixo o que determinou a Emenda Constitucional citada acima:

“Emenda Constitucional nº 37, de 12 de junho de 2002

(…)

Art. 3º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias a a vigorar acrescido dos seguintes arts. 84, 85, 86, 87 e 88:

(…)

Art. 87. Para efeito do que dispõem o § 3º do art. 100 da Constituição Federal e o art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, serão considerados de pequeno valor, até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras pelos entes da Federação, observado o disposto no § 4º do art. 100 da Constituição Federal, os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário, que tenham valor igual ou inferior a:

I – quarenta salários mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal;

II – trinta salários mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.”

As LDOs posteriores tinham dispositivos semelhantes. E o Projeto de Lei das Diretrizes Orçamentárias para 2026 também estabelece o limite de 30 salários mínimos para a RPV. Veja abaixo:

“Projeto de Lei nº 392/2025

Dispõe sobre as Diretrizes Orçamentárias para o Exercício Financeiro de 2026 e dá outras providências.

(…)

Art. 32. A Lei Orçamentária destinará dotação específica para pagamento dos débitos consignados em requisições judiciais de pequeno valor, na forma preconizada no § 3º do art. 100 da Constituição Federal, bem como no inciso II do art. 87 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.”

Ou seja: 30 salários mínimos está estabelecido, está reiterado e está funcionando há mais de duas décadas em nosso município.

A justificativa esfarrapada, os erros técnicos e a falta de honestidade legislativa

O mais revoltante é que, ao apresentar o Projeto de Lei que reduz o teto da RPV de 30 para 10 salários mínimos, o Prefeito Eduardo Paes não teve a coragem de dizer isso com todas as letras. Nem o texto do PL, nem sua justificativa, nem qualquer trecho da legislação citada, explicita, de forma clara, que o objetivo é cortar em dois terços o teto da Requisição de Pequeno Valor no Município.

Trata-se de uma estratégia ardilosa, de ocultamento deliberado. Esconder do povo e dos vereadores o que de fato se quer fazer é uma forma disfarçada de desprezar o princípio da transparência legislativa e o respeito à democracia.

Na justificativa do projeto, o Prefeito alega que há necessidade de conter gastos, que existe um impacto financeiro relevante, que o novo valor “reflete melhor a realidade fiscal do Município”. Mas essas alegações não convencem.

Afinal:

O limite de 30 salários mínimos vigora desde 2004, sem causar colapsos fiscais.

O Prefeito vive dizendo, com sua retórica estilo “TikTok”, que a saúde financeira do Município vai bem, que tem dinheiro sobrando, que a arrecadação cresce com eventos e turismo, e que a cidade tem condições de trazer artistas internacionais e fazer grandes festas públicas.

Ora, se a arrecadação cresce e a cidade “vai bem”, como o Prefeito adora repetir, por que então prejudicar milhares de servidores e cidadãos com essa mudança injusta, desnecessária e cruel?

E mais: não há qualquer previsão no chamado “Novo Regime Fiscal” municipal (Lei Complementar nº 235, de 2021) que imponha esse tipo de corte. Nenhum artigo da lei menciona ou autoriza a redução do teto da RPV como medida de ajuste. É uma escolha política pessoal e maldosa do Prefeito, fruto de sua obsessão em cortar onde há menos resistência.

Veja o Projeto com seus próprios olhos. O texto está disponível neste sítio:

https://drive.google.com/file/d/1i24gc_E92vhyyjOK7zhtw0Rgb-AyOJvb/view?usp=drivesdk

Ao abrir o documento, o leitor vai sentir um calafrio ao se deparar com mais um vexame da atual assessoria do Prefeito. Em pleno documento oficial, assinado pelo Prefeito, encontramos erros primários e básicos como:

O uso incorreto do termo ‘salários mínimos’ com hífen, que está em desacordo com a norma culta da língua. Acredito que a atual assessoria do Prefeito esteja utilizando – sem conferir – o ChatGPT para elaborar seus textos, pois o hífen nessa expressão é uma das “alucinações” que esse tipo de ferramenta de Inteligência Artificial costuma cometer.

Conforme podemos ler na página 303 do Manual de Comunicação da Secretaria de Comunicação Social do Senado Federal (2023):

“Salário mínimo/salário-mínimo

Salário-mínimo (com hífen) é o trabalhador cuja remuneração é o salário mínimo (sem hífen). Plural: salários mínimos, salários-mínimos.”

A escrita “10 (dez)” de forma errada, desrespeitando a Lei Complementar municipal nº 48, de 2000, que trata da elaboração e redação de leis municipais. Essa lei, no seu art. 10, inciso II, alínea “f”, diz expressamente:

“f) grafar por extenso quaisquer referências a números e percentuais, exceto data, número da lei e nos casos em que houver prejuízo para a compreensão do texto.” (Redação dada pela LC nº 51, de 2001)”

Não me parece que escrever a palavra “dez” cause algum prejuízo para a compreensão do texto da lei

Esse desrespeito à norma culta e à legislação municipal não é mais surpresa. A qualidade legislativa da atual assessoria do Prefeito vem sendo alvo de críticas. A diferença agora é que os erros de técnica legislativa se somam a uma tentativa de prejudicar milhares de pessoas, de forma dissimulada e silenciosa.

A tesoura do Prefeito não corta só direitos: corta justiça, dignidade e esperança

O que está em jogo com este projeto maldoso de Eduardo Paes não é apenas um número. É o tempo que o servidor espera. É a aposentada que já venceu na Justiça e não pode esperar mais. É o pensionista que luta para pagar suas contas. É o fornecedor pequeno que prestou serviço ao Município, venceu na Justiça e agora vai ter que esperar mais um, dois, três anos.

É gente que precisa do dinheiro para viver, não para especular.

E o Prefeito sabe disso.

Reduzir o teto da RPV não é uma necessidade técnica, é uma maldade política. Não há mandamento constitucional, não há exigência do novo regime fiscal, não há recomendação técnica — apenas uma vontade unilateral do governante de cortar, de diminuir, de espremer, sempre do lado mais fraco.

Enquanto isso, os discursos da Prefeitura seguem espalhados em vídeos ensaiados, editados com música de fundo e poses estrategicamente estudadas. Discursos que falam em otimismo, crescimento, investimentos. Que falam em uma cidade que “se vende bem lá fora”. Uma cidade que investe em grandes eventos, que patrocina espetáculos com cachês milionários para artistas internacionais.

Mas essa mesma cidade, dirigida por esse mesmo prefeito, nega R$ 20 mil a um servidor público ou cidadão que venceu uma ação judicial.

É esse o Rio de Janeiro de Eduardo “Mãos de Tesoura” Paes.

E não é de hoje. A tesoura do Prefeito já cortou salários, já mutilou direitos, já violou planos de carreira. Agora, tenta cortar a própria efetividade da Justiça.

Mas quem tem memória, resiste. E quem já lutou para vencer na Justiça, vai continuar lutando para fazer valer o que é seu.

Não é possível que o Parlamento da cidade se cale diante disso. Não é possível que os vereadores aceitem aprovar um projeto que, além de injusto, é covarde em sua forma — pois nem coragem teve de dizer ao povo o que estava fazendo.

E se aprovarem, que saibam: cada voto será lembrado. Cada nome será lembrado.

Porque a história também é escrita com tesouras — mas é lembrada por quem sangrou com os cortes.

ment
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1 COMENTÁRIO

  1. Nosso prefeito aprendeu com Guedes e Bolsonaro a dar calote nos precatórios!

    Desta vez, o militante jornalista tem razão! Isso é um erro!

    TamU juntU!

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