Os bizarros ataques sofridos por Marina Silva na Comissão de Infraestrutura do Senado, na semana ada, são um cartão de visitas que revela a face machista e sexista da maioria dos representantes da “casa revisora” nacional. A ministra do Meio Ambiente e Clima, porém, não recuou diante dos ataques absurdos e desonestos. Até vinha, mesmo boicotada recorrentemente pelo presidente da comissão, Marcos Rogério (PL-RO), respondendo a todos os questionamentos. Com firmeza e clareza nos argumentos. Só que tudo tem limite. O caldo entornou e Marina, abraçada pela maioria da sociedade, ganhou força. O jogo, entretanto, segue desfavorável à defesa do meio ambiente.
O governo Lula titubeia no tema porque representa uma frente amplíssima, que reúne adeptos do “quanto menos licenciamento melhor”, mas também vem promovendo uma vigorosa retomada da força de comando e controle do Ibama, torpedeado no governo Bolsonaro (2019-2022). Pisa em ovos neste cenário de um parlamentarismo não oficial, turbinado por orçamentos secretos. O agro, sabe bem o presidente, é aliado de força. Só que Marina é igualmente imprescindível: representa a agenda inovadora da qual o Brasil precisa avançar – e não apenas avançar, mas atuar globalmente como impulsionador da descarbonização e do combate à emergência do clima.
A quatro meses da COP30 da Amazônia, fica o alerta da escalada dos discursos de ódio à defesa ambiental, e por tabela, às comunidades indígenas e tradicionais. O PL da Devastação, sejamos francos, não propõe atualizar ou desburocratizar. Promove, isso sim, um ataque direto à retomada dos preceitos da Política Nacional do Meio Ambiente, há 34 anos consagrada no país. Quer acelerar processos mesmo em áreas altamente sensíveis (com florestas e biodiversidade) e tirar o controle dos processos do Ibama. Os que o sustentam repetem à exaustão uma grande mentira: de que o licenciamento, nos moldes atuais, induz atrasos e freia o desenvolvimento.
Aos fatos: a Agência Lupa analisou 6,1 mil autorizações emitidas pelo órgão nos últimos dez anos e mostra que a maioria delas foi concedida para empreendimentos dos setores de petróleo e gás, hidrelétricas e mineração, que concentraram, ao menos, 68% dos licenciamentos. Somente para óleo e gás foram mais de 151 licenças em 2024 – mais que o dobro do registrado em 2023, primeiro ano do governo Lula, e em 2022, último ano da gestão Bolsonaro. Foi um recorde dentro da série histórica analisada, superando o pico anterior de 123 licenças concedidas em 2015.
Renomado jurista da área ambiental, Paulo Affonso Leme Machado certa vez me disse, numa entrevista para o jornal “O Globo”, em 2012: “Se há dúvidas sobre os impactos de um empreendimento, deve sempre valer o princípio da precaução. E a legislação federal prevê a apresentação de EIA-Rima (relatório de estudo e impacto ambiental)”. Na ocasião, a Assembleia Legislativa fluminense tentava afrouxar o licenciamento de atividades mineradoras, no limiar de encontro ambiental no Rio. Diante da forte repercussão negativa e da mobilização contrária do Ministério Público estadual, o governador Sérgio Cabral anunciou a retirada do projeto.
Que a indignação com o tratamento dado a Marina por senadores da República possa garantir a permanência de um sistema de licenciamento justo, eficaz, mas rigoroso. Nosso futuro depende da floresta em pé. Querem envenenar o Brasil.
Quando continuarmos com as chuvas e secas recorde causando desastres humanos e abientais, peçam ajuda para seu Senador e não peçam dinheiro para o Estado.